sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Na fórmula mágica do leite materno há 700 espécies de bactérias

Estudo em mães espanholas mostra que bactérias no leite são diferentes
se as mulheres têm peso a mais ou fazem uma cesariana programada. Esta
flora pode ser importante para o sistema imunitário do bebé.
Além de ser o primeiro alimento, o leite materno promove a protecção
imunitária no início da vida ENRIC VIVES-RUBIO

São centenas de milhões de anos de evolução que estão concentrados no
primeiro alimento de qualquer mamífero. Agora, sabe-se que a
complexidade do leite materno envolve mais um factor. Quando um bebé
humano bebe pela primeira vez o colostro, o leite que a mãe produz
logo a seguir ao parto, está a levar à boca mais de 700 espécies
diferentes de bactérias que vão definir para sempre a flora do seu
tubo digestivo, revela um estudo publicado recentemente na revista
American Journal of Clinical Nutrition.

O leite é um alimento que está adaptado às espécies. Nos cangurus,
onde o desenvolvimento fora da placenta começa mais cedo, a composição
do leite vai-se transformando à medida que a cria, na bolsa da mãe,
cresce e desenvolve ora o cérebro, ora as unhas e o pêlo. E quando
duas mamas são usadas por cangurus com idades diferentes, o leite de
cada uma é adequado a cada um deles.

Nos países em desenvolvimento, nos primeiros seis meses de vida de um
bebé, a amamentação aumenta seis vezes a hipótese de sobrevivência e
evita a diarreia e infecções pulmonares. "O leite materno dá os
nutrientes, as vitaminas e os minerais necessários a uma criança nos
primeiros seis meses e ainda anticorpos da mãe que ajudam a combater
doenças", lê-se no site da UNICEF.

Só há pouco tempo se descobriu que há bactérias no leite materno, mas
as suas características continuam a surpreender. Uma equipa espanhola
analisou agora, em três momentos distintos, as bactérias do leite que
18 mulheres produziram depois de terem filhos: à nascença, um mês e
seis meses depois. As técnicas moleculares permitiram identificar as
bactérias presentes em maior e em menor quantidade.

A equipa descobriu que o colostro tem mais de 700 espécies diferentes
e é dominado por bactérias ácido-lácticas do género da Weisella e da
Leuconostoce por outras como os Staphylococcus, Streptococcus e
Lactococcus. Ao fim de um mês e seis meses, o que passa a dominar são
géneros típicos da cavidade oral: Veillonella, Leptotrichia e
Provetella.

Mas que função terão? "Talvez as bactérias do leite materno sejam
estimuladores imunitários para reconhecer bactérias específicas e para
lutarem contra outras", responderam ao PÚBLICO, por email, Alex Mira e
María Carmen Collado, dois dos autores do artigo que pertencem,
respectivamente, ao Instituto de Agroquímica e Tecnologia do Alimento,
do Conselho Superior de Investigações Científicas de Espanha, e ao
Centro Superior de Investigação em Saúde Pública, em Valência. "Se
isto for verdade, o sistema imunitário materno pode regular as
bactérias a que o bebé é exposto de uma forma atempada e a falta desta
modulação pode ter consequências importantes no desenvolvimento da
flora microbiana da criança e na maturação do seu sistema imunitário."

Via interna de transmissão

Quando os investigadores compararam as bactérias do leite em mulheres
com um peso normal e obesas notaram uma diferença importante na
composição. As bactérias do leite das mulheres obesas eram menos
diversas. Esta mudança pode ser um "mecanismo adicional que explica o
maior risco de obesidade dos filhos de mães obesas", lê-se no artigo.

Outra surpresa foi a composição bacteriana do leite das mães que
fizeram uma cesariana programada, em relação a mães que tiveram um
parto natural ou que, durante o parto, foram obrigadas a fazer uma
cesariana. As bactérias no leite eram diferentes e menos diversas.
"Isto poderá ter consequências nas alergias, na asma e noutras doenças
influenciadas por uma resposta imunitária deficiente", dizem os dois
autores.

Ainda ninguém sabe ao certo como é que as bactérias aparecem no leite.
A equipa analisou a composição bacteriana da pele das mães e dos
bebés, do sistema digestivo das mães, da flora vaginal, mas a
composição do leite é única. Supõe-se que seja por uma via interna,
controlada pelo sistema imunitário, que bactérias específicas do tubo
digestivo chegam ao leite. Esta transmissão pode ser influenciada pelo
stress fisiológico e pela descarga hormonal do parto, já que nas
cesarianas não programadas a composição bacteriana do leite da mãe é
semelhante à do leite de mulheres que tiveram parto natural.
http://www.publico.pt/ciencia/noticia/na-formula-magica-do-leite-materno-ha-700-especies-de-bacterias-1581019

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